quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Adorável Vida de Catarina na Fonte do Indio Guarani Olhando Pro Horizonte em Pose Desbravadora

       Havia uma cidade muito, muito distante. Distante da modernidade, distante do agito, distante de boas ideias. Mas perigosamente perto do moralismo, do tédio e do senso comum. 
       A cidade chamava-se Aldeia Verdadeira. Em seu centro havia uma fonte, muito conhecida pelos moradores, não apenas os de rua que brincavam ali o tempo todo, mas também pelos do Country Club, que não brincavam ali nunca. Era a Fonte do Índio Guarani Olhando Pro Horizonte em Pose Desbravadora.  
         A Fonte do Índio Guarani Olhando Pro Horizonte em Pose Desbravadora tinha uma lenda. Dizia-se que quem bebesse de sua água sempre acabaria retornando a Aldeia Verdadeira, caso saísse. Isso se saisse.
        Enfim, voltando um pouquinho no tempo podemos então ver uma bela garotinha magricela, cujos cabelos sem condicionador balançavam ao vento assustando os transeuntes. Essa  figura é Catarina. Passeia pelo centro da cidadela em uniforme escolar com sua melhor amiga, que também ostenta bela cabeleira e pouca tecnologia. Como a cidade é pequena, não demoram em passar frente a Fonte Do Indio Guarani Olhando Pro Horizonte em Pose Desbravadora. 
     A amiga de Catarina lhe conta a lenda que ronda a fonte, e Catarina se anima "Vou tomar dessa água por que adoro Aldeia Verdadeira!". A amiga ao seu lado olha-a com desprezo "Sério mesmo que você não quer sair de Aldeia Verdadeira?" e ai a Catarina conteve a empolgação, por que adolescentes só fazem o que os amigos fazem. E naquela época todos seguiam o que a MTV fazia. E a MTV não bebia agua da Fonte do Indio Guarani Olhando Pro Horizonte em Pose Desbravadora. Logo, as duas continuaram o passeio e Catarina combinou consigo mesma de voltar  ali e beber a água da fonte sem que ninguém visse.
     Todavia, desde a mais tenra infância Catarina tinha um dom de procrastinação como dificilmente se viu igual na história da humanidade, o que acabou fazendo com que ela acabasse não bebendo da água da fonte. Anos depois, acabou saiu de Aldeia Verdadeira e toda serelepe foi seguir seu caminho por outras paragens.
          Hoje em dia ela só tem a agradecer a amiga que não a deixou beber daquela água. Maior gratidão. Mesmo.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

meus proprios conceitos me corroem
os moldes que eu mesma inventei
até que ponto o normal é normal
até que ponto posso ir?
não sei.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

A Adorável Vida de Catarina no Metrô

* Para nossa adorável Catarina em São Paulo existem dois tipos de pessoas: As bem amadas e aquelas que ficam paradas feito um dois de paus no lado esquerdo da escada rolante do metrô. Ela, pessoa calma e controlada que era, tinha vontade de esfregar no asfalto quente a cara de quem travava o caminho, descendo lentamente a escada rolante, enquanto o metrô, parado na estação, está apitando enlouquecido avisando que vai fechar as portas!Tanto lugar pra fazer turismo, vai ficar observando o que dentro da estação do metrô?

* Catarina acha a linha azul do metrô paulistano inspiradora. O auto falante anuncia: Estação Paraíso... E ela pensa que vai pular do vagão direto no gramado do Éden, nadar em rios de leite e mel e encontrar todos os terroristas suicidas tentando dar conta das setenta virgens que herdaram de Ala.

   O mesmo se dá quando ouve "próxima estação: Liberdade!" . Sua cabeça logo imagina que, saltando do metrô, encontrará o Zé Celso Martinez correndo pelado, enquanto a policia pixa as paredes com palavras de ordem anti-psdbistas! Ou que sairá do vagão voando, como numa propaganda de amaciante, livre, tão livre que ao seu lado logo aparecerão Caetano e Gil na época da Tropicália, voando também, assim como a Rita Lee, num fundo colorido, tocando bandolim... Pensando bem, na verdade o nome da estação deveria ser lsd....
* Catarina acha que os vagões da linha verde parecem quartos de hospital e cheiram a xixi. Mas a moça do auto falante é tão simpática que quase te convence a ficar por ali e tomar uma xícara de café.
*Na linha vermelha não tem moça simpática no auto falante. O maquinista mesmo é quem narra as estações. Geralmente de bem com a vida, ele só falta mandar a população pra puta que pariu logo depois de dizer que estão chegando na estação da Sé.  Que, assim como todos os vagões da linha vermelha, está sempre cheia. Como se os 11 milhões de habitantes de  SP morassem todos na zona leste!


* Catarina, como toda professora, trabalha like a dog e esse dias , ao pegar o metrô na Barra Funda acordou só na Corinthans Itaquera. Depois de quase morrer de susto, acabou descobrindo que isso é tão normal que não se sabe ainda como o Globo Reporter não fez uma reportagem sobre paulistanos que dormem no transporte público.


*No final das contas Catarina acha o metrô uma coisa muito linda, por que é caipira. Quando criança ia para a capital com o pai e achava que andar de metrô era a parte mais divertida do passeio. Para ela não havia como ter tédio naquela cidade!Era só correr para estação mais próxima e partir sem rumo pela paulicéia desvairada! 



terça-feira, 6 de novembro de 2012

Tia Nice


     A casa da Carol, pra mim, sempre representou essa coisa assim meio refúgio, por que ela, de todas nós, era a única que jamais havia se mudado de casa desde que a conhecemos, e o conjunto das coisas dentro de sua própria casa mudara muito pouco também desde então.
   E hoje eu quero falar das férias em 1996 que a gente ganhou o CD das Spice Girls e passou o tempo todo dançando e jogando taco na rua, ralando a tampa do dedão do pé. Depois eu quero falar também de 1999 quando a gente ouvia Raimundos nas noites quentes de verão e achava que era roqueira. Eu quero falar de 2000 quando ficamos de recuperação final de matemática e estudamos como doidas na mesa da cozinha para não ir pra recuperação de verão, evento que poderia nos traumatizar pelo resto da vida (Deus me livre ficar sem férias!). Eu quero falar de 2001 quando tinhamos enormes listas de exercicios, intermináveis, e nenhuma disposição pra fazer.
     Enquanto tudo isso acontecia, os anos passavam, menstruamos, cresceram os peitos, perdemos a virgindade , aprendemos a fumar, começamos a beber. Enquanto os anos passavam nós fomos e voltamos, mas a casa era sempre a mesma. Por que enquanto tudo acontecia, Tia Nice acordava a gente às seis horas da manhã para tomar suco de beterraba com cenoura. E depois na hora do almoço ai da gente se não comesse direito! Era a bendita da lazanha com batata frita e por fim uma fruta. Eu nunca gostei de frutas mas eu comia assim mesmo muitas vezes. Por que se eu falasse que não gostava de frutas, era triste, ela contava todas as qualidades, era bom pra saude, que coisa! E enquanto a gente estudava pra prova de recuperação tudo aquilo que não tinha estudado ano todo, ela fazia mil e uma promessas, rezava pra gente e quando a gente passava vinha de novo a lazanha e a batata frita para comemorar e o bolo de cenoura também. E haviam aquelas noites de domingo jogando caxeta e os dias que eu acordava mais cedo e ficava lá na cozinha conversando com ela enquanto a Carol não acordava. Enfim, houveram mais de mil coisas impossíveis de serem listadas ou ditas, apenas acontecidas.
    Uma aluninha me disse uma vez que o chato de ser adulto é que as pessoas que a gente gosta vão embora. Na época achei esse um pensamento profundo demais pra uma criança de seis anos, mas nunca fez tanto sentido como agora. Acabei de completar quarto de século e a vida todos os dias esfrega na minha cara "Garotinha, nada será como antes." Para o bem ou para o mal, o tempo trata de levar tudo embora, refúgio ou tempestade.
   Gosto todavia das adultas que nos tornamos e da capacidade de nos mantermos juntas mesmo distantes, há anos eu não via a Priscila, há tempos não conversava com a Fernanda. A Talita tinha meses que nem sabia dela, e no entanto todo mundo estava lá, bebendo uma cerveja no meio de um funeral! Não somos insensíveis, somos sensatas, não há que se morrer junto, não há que se derrubar. É dificil dizer no meio desse furacão todo se um dia essa coisa incômoda vai sair do coração e da garganta da gente, mas estamos tentando, isso é parte também das crianças que fomos, das raizes que criamos e em todas essas horas Tia Nice estava lá.   Justo que se beba em sua memória, que se ria de suas lembranças. O choro vem, assim meio besta, quanta bobagem, no fundo fomos todas criadas pela tia Leila, pela tia Vera, pela tia Fatima (aquela tosa!), pela tia Nice, pela tia Rita , pelo tio Sergio, entrando e saindo dessas casas, abrindo geladeiras, levando broncas, a Thais ligando pra mãe dela ir buscar ela (um clássico!) e todos esses fragmentos de vida. Ainda há muito que se viver.
    Daí, depois do fim, a Priscila ainda disse "Bom é ter do que lembrar..." e eu concordei com ela. Bom é ter do que lembrar. Que pelo menos isso o tempo não leva, nossa memória e a capacidade de transporte no tempo que ela  nos traz.  O poeta disse que quem lembra tem. Então, com toda certeza, teremos a Tia Nice sempre junto com a gente. Sem mais.





sábado, 20 de outubro de 2012

"A Adorável Vida de Catarina " no Acre

*Catarina tem uma amiga do Acre, e acredita ser um ser muito especial por conta disso. Quantas pessoas nesse país, digo mais, no mundo, conhecem alguém do Acre nessa vida de meu Deus? 



* "Você já tomou carreira de jacaré?"  pergunta a menina do Acre para os outros coleguinhas. Todos paralisam e se perguntam se carreira de jacaré é um novo drink do  verão, um codinome pra cocaína  ou um novo movimento de MMA. Ela explica "Nadar em certos lugares do Acre pode ser perigoso... Se viu uma ondinha chegando perto de você no açude corre que é jacaré... Eu tomei carreira de jacaré várias vezes. Cansa,viu?". Depois de ver que não faltava nenhum pedaço da amiga, Catarina olhou a "singela" cicatriz do próprio braço causada por um pequeno vira lata nos anos 90 e pensou: "Poser!"



* Na piada de choque cultural numero 1375 desde que conhecera a menina do Acre, Catarina não pôde deixar de morrer de rir ao descobrir que pepetas no Acre são pipas. O que poderia criar situações constrangedoras:
Menina do Acre: Oi moço, vamos lá em casa brincar de pepeta?
Menino de São Paulo ( não sem certa empolgação): Claro vamos!
Menina do Acre trás linha, varetas, papel e cola: quero uma pepeta bem bonita!
Menino de São Paulo sai correndo.

* Pesca-se piranhas no Acre. Come-se piranhas no Acre, é uma iguaria muito apreciada. Só há que se tomar cuidado com certos lugares onde elas possam estar, por conta do perigo. E pensando nisso Catarina não via nenhum trocadilho maldoso, mas a constatação de que, uma pessoa, pra morar no Acre, tem mesmo de ser muito valente...

* Falando em valente, dia desses Catarina conheceu o moço mais valente do Brasil. Mas como o assunto deste post é só sobre o Acre , deixa pra outro dia...



terça-feira, 9 de outubro de 2012

A Adorável Vida de Catarina - Polêmica


    Uma vez a Catarina conheceu um cara que era feio e ficou com ele depois de três copos de vodka. Ela chamava ele de Shrek pelos cantos, por que ela não era uma moça de bom coração. Até gostava de conversar com ele pela internet, mas tinha muita preguiça de vê-lo pessoalmente, a principio, por que, como já sabemos, ele era feio.
    Uma vez ela descobriu então que ele tinha três mamilos. E deu muita risada. Não na frente dele, que Catarina podia não ter bom coração, mas tinha alguma educação. Era moça boa, de boa família e tinha boas prendas. Viu o terceiro mamilo e preferiu pensar na guerra do Afeganistão, que considerava uma coisa muito, muito triste. Mas depois se arrependeu de não ter rido, por que o moço merecia as risadas, para aprender a deixar de ser mal educado! Esse tipo de coisa se avisa antes, não se deixa a pessoa descobrir assim no susto, vai que a sujeita tem problema de coração? Ele não fora nada gentil não avisando-a previamente do mamilo intruso que ele tinha entre os mamilos normais, que ficam um em cada peito. Era uma mamilão na boca do esôfago, aquilo podia matar alguém de susto, era mesmo uma indelicadeza da natureza.
   Três mamilos não são bacanas, é muito mais polêmica pra uma pessoa só, tanto que não deu certo. Um  belo dia o mamiludo resolveu que queria outra moça (que provavelmente tinha três mãos, e poderia lhe satifazer mais plenamente, uma mão em cada mamilo, mexendo-se frenéticamente!)
  Catarina pensava nisso e desandava a rir sozinha no ônibus. E dai todo mundo achava ela louca. Mas nesse caso não havia guerra no Afeganistão que a fizesse parar de sorrir. É que o sujeito tinha se mandado com a "trimãos" faltando uma semana pro carnaval. E o carnaval de Catarina aquele ano...enfim...Contar-se-a outro dia nesse blog.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

A Adorável Vida de Catarina II - Rapidinhas

* Catarina foi com algumas amigas a uma balada dessas onde todo mundo é muito rico ou todo mundo finge que é muito rico, ou ninguém é rico coisa nenhuma, todo mundo entrou vip mas não conta pra ninguém. Era muito bonita a festa, era muito boa a música e muito bons os "drink", que com certeza dariam ressaca no outro dia, por que  um figado criado com Banhauss não consegue discernir o que é Absolut. Enfim.
   Catarina dançava e o rapaz a paquerava, dançava e paquerava, até que o mocinho de gola polo aproximou-se e disse, com todo lirismo e poesia que o momento pedia: "Oi, tudo bem? Eu tenho uma empresa!".
E ela pensou em várias respostas possíveis:
a) Sério? Por que eu tô desempregada, tenho um currículo aqui na minha bolsa, será que não dava pra você me arrumar um emprego?
b) E eu tenho várias propriedades!Acabei de comprar a Avenida Nove de Julho e a Avenida Rebouças. Construí quatro casas e um hotel por lá. (Diz enquanto tira cartas do Banco Imobiliário da bolsa)
c)  Eu tenho um fiat uno 96, vermelho, único dono. Quer trocar?
d) E nome? Você tem?
Catarina escolheu alternativa D, mas todas as outras se encaixariam perfeitamente.

* Catarina andava as voltas com uma paixonite besta por um cara que não sabia que ela existia. E Catarina não cogitava a ideia de que alguém não soubesse que ela existia, por que ela tinha o hábito de balançar os braços para cima e mover a cabeça enquanto falava, quase uma dancinha de axé mal coreografada dos anos 90. 
  Catarina nunca soube ser sutil e tampouco queria se arriscar pelo escândalo. Inconformada andava pelas ruas com o mp3 no ultimo, pensando que jamais saberia se era correspondida, por que ele, ao contrario dela, era tão sutil, mas tão sutil, que se tomasse um chute nas partes era capaz de soltar um sussurro de leve e continuar caminhando como se nada tivesse acontecido... 





segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Pobreza....

Olhou pela janela e concluiu: assim como a fumaça leva embora a nicotina do cigarro, se esvaíra dela toda e qualquer capacidade possível de apego. Suspirou. Pobres rapazes. Pobre dela. Pobre do mundo que já não se recupera. Pobres. Pobres. Pobres.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

A Adorável Vida de Catarina I

    Era carnaval em 2004 e havia acabado de chover, por que no carnaval chove, sempre chove. Deviam fazer um carnaval por semana no sertão do Ceará pra ver se resolvia o problema da seca. Enfim, chovera.
     Ela comera um lanche e ainda mastigava o ultimo pedaço quando encontrou alguns conhecidos da escola, ninguém muito importante, mas como não tinha muita companhia (as amigas sumiram, no carnaval pessoas desaparecem) seguiu seu caminho com os conhecidos.
     Tinha o Bonito, que tinha quase dois metros de altura e era mesmo bem bonito, conversa vai, conversa vem, ela mal engoliu o lanche e ele colocou-a num banquinho, deu-lhe um beijo daqueles desesperados e depois levou-a em casa. Catarina era bem tonta nessa época, beijava e pensava em casamento, mesmo no meio do carnaval, eles tinham combinado de se ver no outro dia e se viram mesmo, junto com o grupo de conhecidos assim não tão conhecidos, saíram pela cidadela, cantando marchinhas e o dia foi acabando e o Bonito com aquela cara linda de paisagem, passou o dia enrolando a Catarina, quando foi de noite ela se deu conta que era carnaval e foi tomar um rumo. Nunca mais viu o Bonito.
    Era carnaval em 2012 e Catarina, na mesma cidadela de sempre, andava com muitos amigos. Foi dançando pela rua, quando um dos amigos apontou, enlouquecido, para a multidão "Olha ali, gente, meu ex-namorado!" e a Catarina olhou de lado, a cidadela tinha ruas apertadas, o encontro foi inevitável. 
       Já iam muitas horas bebendo Maria Mole, então ela precisou olhar bem, olhar direito, que era pra ter certeza que não estava tendo uma alucinação alcoólica. Mas a vida é mesmo uma brincalhona de primeira! E não era que o ex namorado do amigo era o mesmo Bonito do carnaval de 2004? Pobre Catarina! Passou a noite morrendo de rir de si mesma!
      Era meio de ano em 2012 e a Catarina agora era uma adorável professorinha serelepe que dava aulas para adultos ingratos numa escola qualquer do centro da cidadela. Chegou para trabalhar num dia de chuva, o cabelo escorrendo umidade do tempo, a roupa molhada nas beradas, tudo ia bem, e ela viu na secretaria o bendito Bonito ( que agora podia ser chamado de Bonita. Ou linda. Ou diva. Ou ahazo. Ou aloka. Ou pelo próprio nome também, dependendo da preferência) sentado, fechando matricula. Ele não a viu passar e nem ela queria que ele a visse. Estava um pouco sem graça também, melhor evitar a fadiga! Mas no final de dez minutos a secretária bate na porta de sua sala "Tem aluno novo, Catarina!" e lá estava o Bonito, que não sabia onde enfiar a cara de vergonha.... Catarina por sua vez, com sua mania de ser espertinha, foi anotar o nome do novo aluno na lista de chamada"Você é o Bonito, não é?" e ele afirmou imerso em timidez, por que em seu intimo rezava para que Catarina não lembrasse de seu rosto, mas ela era conhecida por ter uma ótima memoria ( sabia contar, nos mínimos detalhes, tudo que acontecera no dia 17 de abril de 1997, mesmo essa sendo uma data irrelevante em sua vida) e não o havia esquecido. O moço era mesmo muito bobo. Vergonha de que? Se fosse esperto teria feito amizade com Catarina e os dois iriam ao cabelereiro juntos pro resto da vida! Mas ao invés disso, depois de duas aulas nunca mais apareceu no curso! Quanta bobagem...




   "Essa historia é ficção. Qualquer semelhança com nomes, fatos ou lugares terá sido mera coincidencia."

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Agora eu já sei...

São Paulo, 19 de setembro


         O passado é mesmo muito engraçado. Por que ele simplesmente é algo que não é mais. E o mais engraçado é como as coisas acabam se desvinculando, como as coisas acabam mudando, como as coisas acabam se resignificando. Eu gosto dessa palavra, ela é tão completa de sentido, e tão cheia de experiência, tão carregada de coisas e pessoas, tão repleta em si mesma daquilo que fazemos todos os dias. Resignificar. Bem ou mal, é rotina, bem ou mal é a vida.
             Ultimamente eu tenho observado as coisas e as pessoas e o refrão continuo é "ah, entendi!" por que muita coisa mudou, na verdade tudo, e quando digo tudo, é tudo mesmo, num sentido muito mais amplo que a mudança simples de endereço.
             Eu nunca fui de fato uma pessoa compreensiva. Nunca me esforcei para isso, por que as coisas sempre me pareceram tão fáceis e tão bem encaixadas que não necessitava entender ninguém ao meu redor. Tudo me vinha pronto. Agora eu entendo como é. Agora eu já sei.  
         Eu tinha sonhos, por que todo mundo tem, mas eles eram distantes, isso me matou por dentro um bom tempo, mas agora eu sei o que é tê-los nas mãos, tocá-los e dizer "É meu esse sonho, e ele está aqui agora todos os dias" e ele está mesmo, todo dia, quando meu despertador toca e eu acordo cansada, com preguiça, pra pegar metrô lotado e atravessar a cidade de ônibus, pra conseguir ter aula na escola que escolhi.  Agora eu sei por que há a perseverança, por que não é todo dia que um sonho se torna palpável, não é todo dia que ele está ai, ao alcance das mãos, agora eu entendo o sacrifício, as horas despendidas em livros, a procura desesperada, mais ainda,  a ausência de tranquilidade, e ausência de compreensão de quem ainda não passou por todo esse processo.
              Minha relação com dinheiro nunca foi nada demais, sou mesmo assim meio solta na vida e você sempre soube disso, na verdade, agora eu já sei, porque isso te deixava ás vezes em profundo desespero, por que dinheiro falta, ele some, quando vem de outrem e a idade já vai avançando maior o desespero em querer guardá-lo, fazê-lo render, agora eu já sei. 
                E ai, eu, que já sei agora tanta coisa, descubro que nunca soube porra nenhuma na vida. Mas eu pude aprender, olha só que coisa, com o pouco que sabia, e agora eu já sei como não ser. Meu sonho está palpável, meu dinheiro está escasso, mas apesar de tudo eu não me tornei egoísta, agora eu já sei. De tanto medo de ficar assim perdida e desesperada, eu entendi, mas isso na verdade sempre soube, algumas pessoas não podem ser usadas como válvula de escape, envoltas em vidros de segurança a serem quebrados em dias ruins. Eu tenho as mesmas condições e outras percepções. Não é uma coisa de louco a cabeça do ser humano?
                Eu me canso e corro, deixo pra trás bobagens, deixo pra trás futilidades, que a vida urge em seguir em frente com aquilo de bom que me tem dado, agora eu já sei e isso me faz feliz, agora eu já sei como ser e como não ser, sei como era e como não voltarei, aprendi também, esse mundo, eterno carnaval, o desprendimento necessário, o valor do descartável, tudo isso eu aprendi.
    E, como já disse, gosto de quem ando sendo, e senti que devia te dizer todas essas coisas por que sei de tudo e cada vez que as experiências se repetem eu vejo novamente aquelas cenas, não sem uma pitada de remorso, poderia ter gritado menos e ouvido mais, humildade não me falta, mea culpa, questão de consciência apenas. Então guarde seu ego e possíveis conjecturas numa mala velha e jogue-a no rio. Junto com meu remorso. Por que nenhum desses sentimentos leva ninguém a nada. Não se pode mudar o passado, tampouco me interessa recuperá-lo. O fato é que entendi, finalmente entendi.  E não há que se preocupar com tudo que foi dito, tudo que saiu de sua boca e me chegou aos ouvidos, não era mesmo tudo verdade? Acusando-me, acusavas a si mesmo, cometemos esse crime juntos, cada um com culpas diferentes. Por isso eu digo que entendo. Finalmente entendo.


                                      saudações cordiais                                                                                      Daniele Andrade

                                                     

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Aniversário do Rodrigo

     
( Som na caixa que é hora de nostalgia... por onde anda o Roxette?)


     Todo ano, quando vem setembro (fresco e ensolarado), eu fico me perguntando se ao invés de ir aquele aniversário, eu tivesse ido para Minas, no casamento dos meus primos, como tencionava a principio. E tudo teria sido diferente, e tudo teria sido, mal ou bem, nada o mesmo, ouviria falar daquela festa, mas seriam lembranças dos outros. 
      Primeiro de setembro de dois mil e um. Eu fui a uma festa com minha prima. Antes, ela alisou meu cabelo com chapinha (pela primeira vez!) e eu ficava jogando ele de um lado para o outro impressionada com aquela nova tecnologia! 
    A festa começou as sete, o aniversariante fazia quinze anos e ganhou 450 cds da trilha sonora de "Um Anjo Caiu do Céu",  eu fiquei duas horas no banheiro olhando meu cabelo novo no espelho, minha prima olhou pra um cara num dos cantos da festa e disse "não gosto dele, por que ele me empurrou na fila da cantina semana passada", tocava Milk and Toast and Honey, eu fui perguntar pro cara por que ele tinha empurrado minha singela prima, tinha um videokê também (por que era moda nas festas da época), ele pediu desculpas pra Carol e no final das contas virou minha grande paixão da adolescência. 
        Eu achava me apaixonar a coisa mais brilhante da vida, cheguei da festa e me demorei a dormir.  Olhando para o teto de madeira do quarto na casa da minha avó, me senti muito mulher por estar apaixonada pelo cara que tinha conhecido horas atrás. Eu tinha treze anos .
       Desde então, todo ano, quando chega Setembro, tenho expectativas idiotas, como se o mês viesse abençoado por alguma magia que fará com que tudo dê certo. Minha pele não terá espinhas, todos os dias serão de sol, vai ventar no meu cabelo o tempo todo e eu ganharei uma viagem com tudo pago para a Irlanda, com direito a show do Westlife e cerveja grátis em todos os pubs de Dublin!
        Eu tenho essa mania de amor platônico. Paixonites curtas me inspiram, me fazem fugir a cabeça no metrô lotado às seis da tarde. Algumas das minhas amigas já nem levam mais a sério quando chego contando sobre como conheci o homem da minha vida, por que isso acontece uma vez por semana. No fundo eu também sei que não há de ser nada.  É sentir pelo simples prazer de sentir, se eu for uma pessoa que não sente nada eu não escrevo nada, e é melhor que eu escreva, pois não há nada que eu faça de melhor nessa vida, mesmo que não sejam coisas assim tão boas, é um habito que não conseguiria viver sem. No mais, na grande maioria das vezes, minhas paixões não vão além do plano das idéias, viram contos, e o objeto da paixão não toma nem conhecimento de tudo que se passa. 
Uma outra prima minha certa vez aos sete anos ouviu a expressão "amor platônico" e quando perguntei a ela o que significava ela responde "platônico é uma bolha!" e todos riram. De qualquer forma, foi uma ótima metáfora!

      Esse discernimento todavia é novo. Antes no tempo, eu tinha uma mania besta de querer transformar o platônico e querer torná-lo real, me jogava nesse vasto oceano de ilusões sem máscara ou escafandro. Mas, quando uma vez eu me afoguei quase fatalmente, aprendi a lidar com a superficialidade a meu favor. Me atirem pedras recheadas de frases de efeito do facebook, mas eu aprendi o valor do descartável. Não temos ombros suficientes para carregar todos conosco vida a fora, e ainda há tanta gente a se conhecer...
     Entenda-se, o momentâneo não é sempre ruim, nem sempre precisa ser vazio. Alguns chamam de energia, o santo que bate, vai entender! Mas tem certos encontros que de fato são deveras intensos e duram o tempo que precisam durar, nem um minuto a mais, nem um minuto a menos.
     Sou como uma novela mexicana. Sentimentos, amores, dores, loucuras e dissabores, todos viscerais. Podem ser curtos. Mas, o que é mais curto do que a própria vida humana, afinal? 
     Por fim, isso é uma fase, como tantas outras. Como toda boa mocinha de novela mexicana, eu ainda tenho resquicios de antigas vontades, e sei que hora ou outra vou me apaixonar por um mané qualquer que disser que leu meu blog e amou aquele conto sobre paixões platônicas que eu publiquei certa vez. E eu vou ficar doce doce doce.....

Em tempo: Parabéns atrasado por mais um aniversário, Rodrigo! Que você continue sendo essa gracinha de pessoa por mais 977 anos 

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Ostra Feliz



        Essa semana ouvi um professor dizer algo a respeito de vivermos sob a ditadura do equilíbrio. Nunca fez tanto sentido. Nessa onda de filosofias orientais, o desequilíbrio virou pecado  mortal. Mas o que é equilíbrio afinal de contas, e eu fiquei pensando tanto, por que o equilíbrio, se não vivemos num mundo onde a balança seja igual? 
            Não há castigo, nem recompensa, apenas uma sucessão de acertos e erros, e eu tenho errado tanto e tenho pensado tanto nesses erros, mas não consigo parar de errar. E vou compreendendo mais coisas, foi como se o mundo entrasse pelos meus ouvidos, ultimamente tenho pensado e conversado tanto com tanta gente, são onze milhões que entram e saem do metrô, correm como loucos, vivem como loucos, estressados, a beira de um ataque de nervos, os passos rápidos, e tanta coisa a se refletir e tanta novidade e tanto assombro, tudo tendo que se encaixar a novas formas e novas conexões e novas coisas e novos ambientes e tudo tão fresco mas tão ultrapassado, eu não quero me equilibrar. Não foi do equilíbrio que me vieram as piores coisas que me aconteceram, mas também não foi do equilíbrio que vieram as melhores. Sentimentos, amores, dores, loucuras e dissabores, todos viscerais. 
      Não se sabe o sentido dessa coisa toda estranha que nos fazem chamar de vida, mas a verdade... às vezes dói nos ossos sabe-la, mas no fim todos nós acabamos frustrados, por que vivemos atrás de um equilíbrio impossível, de uma completude imaginária, que se fosse inerente ao ser humano não seria tão impossível de se alcançar. 
      Ostra feliz não produz pérola, ditado meio imbecil, desses que a gente compartilha no facebook, mas tem ressoado na minha cabeça esses dias. Não se trata todavia de felicidade, nem apologia a melancolia. Se trata de intensidade. Descobri que quem nada em águas rasas não se afoga. Simples assim. E nunca produzi tanto. A euforia salva. A depressão também. Há que se sentir, há que ser humano, tanto sangue nessas veias correndo a toa, equilíbrio é soldado marchando pra guerra, na mesma direção fria, as mesmas roupas, os mesmo cabelos, equilíbrio é pasmaceira, a natureza às vezes se cansa de seu próprio equilíbrio e nos manda furacões a arrasar com tudo, maremotos a tirar a calmaria de praias antes pacificas, é preciso cair e levantar, se dilacerar diante do mundo, por que ele é o que é, jamais equilibrado, por que é retrato do próprio homem que o habita. 

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Desastres

       No mundo restaram poucos fumantes, por que o fascismo é mesmo uma coisa delicada e sutil. Acabar com o pulmão nunca foi nada perto de muita barbaridade que se vê por ai, mas esse não era mesmo o ponto, ela saiu na varanda, deixando a festa lá dentro, por que precisava de tabaco nas veias. E de lá contou quantos fios rodeavam o poste, era uma casa no centro, e o centro era grande, não havia muito horizonte, contou os fios do poste, depois os carros na rua, e emprestou a ele um cigarro, por que ele não trazia consigo os seus, vai saber, às vezes os lugares fecham, e tudo acaba tão cedo, mas a noite ainda ia adentro, complicada, emprestou cigarro e isqueiro, depois olhou de novo os fios no poste, não se atinha a maiores detalhes a principio, por isso não deu grande importância. Tudo vinha sempre depois, muito depois.
       O mundo era culpa dos cálculos, quanto preconceito naquela cabeça, ele só escutava "Não creio que seja isso.." murmurou, mas ela não sabia, colocou a culpa dos males naqueles que calculavam, no concreto armado dos viadutos, na falta de poesia do cimento, na ausência de alegria do cinza. Seria tudo tão mais claro se fossem as coisas menos contabilizadas e mais declamadas, a plenos pulmões, pelas bocas irriquietas que perambulavam pelas ruas, enchendo de som liberto tão grandiosa cidade.
       Ele andava muito magro por aqueles idos e fumava muito. Não entendia muita coisa nessa vida, se sempre pudera de tudo, era uma criança ainda quando a mãe lhe disse "Podes tudo, meu filho!" e ele acreditara e desde então sempre pudera, mas quando perdera a amada moça, viu que talvez não pudesse "Eu tinha que parar de fazer tudo que me vem a cabeça" andava bebendo também, há pouco tempo capotara o carro. " Qual o problema nos cálculos, são apenas números, eles vem e vão como qualquer coisa da vida, não há nada que se possa fazer, senão deixa-las passar, e mesmo que no lugar de números  fizéssemos nosso prédios apoiados em poesia, um dia, mesmo assim, todos acabariam caindo, desmoronando, as palavras são tão inúteis quantos os números, quanto os fios que seguram esse poste. Inúteis." e ela engoliu preconceitos , deu uma ultima tragada e depois não soube mais.
      Chamaram-na na sala, ou outro cômodo, era uma festa afinal, mas como cantar depois daquilo, o mundo, poesia ou número, dia ou outro acaba desmoronando, oh céus, quanta coisa. 
      "Anda bebendo demais esse nosso amigo!" ainda disse o anfitrião. E todos concordavam, enchendo-lhe o copo com cerveja, beber demais nunca foi privilegio de uma pessoa só, todos sabiam, bebia-se a revelia de qualquer pequena dor, quando advinham as maiores, ninguém nem percebia, comentava-se para não perder o habito.
      Já havia muito tempo desde a ultima vez que fora até aquela casa, cantavam como sempre, anos passam e hábitos não mudam, e ela resolveu sair novamente , mas cansou-se de contar os fios do poste, era tudo muito natural. "Você me parece meio perdido..." e ele apenas sorriu "Quem não está?" e depois de longa pausa  "Capotei meu carro dia desses." E quem não sabia? Capotou o carro e todas as outras coisas, foram tantos dias perdidos, mas ela vira tudo de longe, imersa que estava no próprio desastre "Capotei meu carro e não senti nada.". E ela acendeu outro cigarro "Eles vem assim mesmo, acidentes de carro ou despedidas, às vezes tem o mesmo efeito, não? A Frida Kahlo disse isso uma vez ou algo parecido." Ele olhou o poste, por que eles não se olhavam nunca. "Deve ter dito, todo mundo diz tanta coisa. Não sei, não lembro. É a aquela com as grandes sobrancelhas, não?" e ela confirmou.
      E a noite acabou, a festa acabou antes, todos foram dormir e os sonhos todos turvos, por que ela finalmente conseguia repousar, mas não pode deixar de lembrar, logo pela manhã, das cicatrizes cujos caminhos foram mapas daquele corpo que lhe pertencera a noite toda.  Marcas do desastre. As cicatrizes dela, tão profundas quanto aquelas, menos palpaveis porém, bem disfarçáveis, ele as tinha em todo corpo, toda a pele "Sou prova viva do que me ocorreu, apesar de já não senti-lo" bebera, fumara, perdera peso, estava longe da bela amada, e ela entendeu tudo, mas não dissera nada. Somente as tocara, aquelas cicatrizes tão bem marcadas, tantos médicos intervindo naquele corpo, para faze-lo voltar a vida, e ele voltara, mas  corpo tão vivo abrigava  a alma vazia.
        Sonhava, e repousou naquele peito durante longas horas (como se sonhar que está dormindo fizesse algum sentido) e acordou consolada. Fossem poesias ou números, no final tudo afundava. O sol entrava pela janela e ela tinha sede. Como há muito tempo ela quisera finalmente voltar a querer machucar-se, voltar a querer arriscar-se, sem escudos, frente a tão perigoso campo de batalha. Mas era tarde demais ali. A amada voltara (desastre ou não) e ocupara o lugar que deixara vazio. Mas isso também já não importava.
       Sentou-se no sofá e esperou. Aquela porra toda compensava. Finalmente compensava. Deixara de fazer sentido há muito tempo, mas parecia de qualquer forma encaixar-se na vida como se nunca houvesse saído dali Acendeu o ultimo cigarro da cartela que quase toda ele fumara com ela. E viu aquela noite sumir de vez na fumaça.


quinta-feira, 23 de agosto de 2012

PARTIDO DA SINCERIDADE

É fato, todo mundo sabe da minha paixão platônica pelo Marcelo Adnet, por que ele é incrivelmente talentoso, inteligente, engraçado e casado com a Dani Calabresa que é a melhor do universo. E nessa época de eleições não poderia deixar de postar essa perola do humor cretino que ele tem. Adoro!Partido da Sinceridade....pelo menos com esse não tem surpresa!


segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Feliz dia 19 de Agosto!

           Ah o bom e velho 19 de agosto! É o dia que fico pensando que a vida é uma sequência de coincidencias imbecis. Eu, assim como o marido da Rochelle, poderia ter dois empregos. Vamos aos fatos.
     Sou formada em História naquela nave louca que é a Universidade Federal de Ouro Preto. Um curso muito bacana onde pude aprender a beber e jogar truco, e onde ouvi falar pela primeira vez de um tal de Marc Bloch , que a gente ama mais que feijão com arroz. O cara era bom mesmo. Diz a lenda que conseguiu escrever quase um livro inteiro dentro da prisão nazista, sem acesso a referências bibliográficas quaisquer e acertou todas, só de memória! Acredito que esse fato afetou tanto o orgulho de classe dos historiadores que vários professores ao dar aula ficavam fazendo citações em cima de citações e não explicavam porra nenhuma. E eu ficava lá na ultima carteira, escrevendo alguns dos contos que você lê neste blog, por que, afinal de contas, eu sempre tive as minhas prioridades.
(Marc Bloch de ladinho. Tão amado que até o John  Lennon  copiaria  seu óculos style anos mais tarde)
        Bloch não terminou o livro. O exercito nazista o matou antes do fim. Mas, deixou boa parte já pronta, o que nos fazia pensar, em época de provas, na ineficiência dos serviços públicos quando se precisa deles, mesmo no primeiro mundo. Se o exercito alemão fosse de fato eficiente  teria matado o Bloch antes de ele ter escrito tudo aquilo! (essa piada é clichê de nove entre dez alunos do primeiro periodo.)
        A maior diversão de um historiador é destruir as teses de seus colegas.  O pau quebrava em alguns seminários. Mas tudo na base do "Caro colega está equivocado nesta sua colocação...". Aliás, desacreditar tese do coleguinha é coisa que aprendemos  desde o principio, então já no primeiro ano víamos alguns alunos ávidos em desbancar os professores, o que as vezes tornava as aulas parecidas com um torneio de repentistas nordestinos da praça da Sé.        





           ( No primeiro período me disseram que os historiadores davam voz aos mortos. Achei forte!)



         De qualquer forma sempre achei fantástico  o que o Bloch dizia sobre como a História deveria ser feita numa linguagem que alcançasse a todos. Não há sentido nenhum em tanto estudo se não for acessível. Mas, obviamente não é bem assim que acotece.
         Dói no coração do historiador ver o 1822 virar best seller. V um ex colega espumar de odio quando eu disse que era válido o esforço do Eduardo Bueno em disseminar o interesse histórico. E ele mal tinha começado o curso! "Eduardo Bueno é jornalista!Não estudou o bastante!". E no final das contas muita coisa realmente não tem muito sentido, mas se os historiadores (que estudam bastante) pensassem mais vezes fora da caixinha talvez existissem mais obras melhor embasadas e com um linguagem mais acessível a maioria da população, gerando mais interesse! Mas a maioria dos acadêmicos passa seus dias procurando palavras difíceis nos dicionários, que possam dificultar a leitura de suas teorias, para que ao seu redor digam que sua escrita é complexa (um puta elogio!!).
Mary del Priore: Inteligencia e Loosho.  É a Glória Calil  da historiografia!











    Assim como a roupa do rei, só os inteligentes conseguem ver esse tipo de coisa, como a Mary del Priore, que é puro loosho, glamour e competência, escreve com a maestria de um romancista e  embasamento teórico  para nenhum primeiro anista empolado botar defeito!
       Enfim, uma vez formada, diplominha de federal na mão, (orgulho da mamãe que fala isso pra todo mundo) olhei pra vida e fui finalmente fazer teatro. E no teatro fiz uma descoberta encantadora! Meu curso de história me servia finalmente pra alguma coisa. Construir um personagem é muito melhor quando se entende contextos, a arte é toda contexto e toda pensamento humano, beijo Zé Arnaldo!
       Gosto das artes cênicas, do teatro mesmo. Aquela coisa sofrida de se fazer, mas linda de se ver. E toda vez que falo pra alguém que estudo teatro elas me pedem pra lembrar delas no arquivo confidencial do Faustão, como se o destino de todos os atores fosse a Globo. 



Fui no arquivo confidencial e me lembrei de você.
    Mas sempre que digo que acho TV um porre as pessoas me olham como se eu fosse de outro planeta (afinal de contas, de que serve ser atriz se não for para sair em capa de revista de fofoca com um affair misterioso em algum barzinho badalado do Rio de Janeiro?) 
    Há  também o clube daqueles que acham uma judiação uma moça que estudou tanto jogar tudo pro alto pra fazer teatro. E há também a galera que pergunta se eu pretendo continuar estudando e quando falo que já estudo,  reiteram "Mas estudar que eu digo é estudar, mesmo!" e eu fico pensando o que  podem vir a ser  as horas que passo debruçada no Stanislaviski ...
        Atores não usam boina e cachecol. Por que somos pobres, muito pobres. Às vezes, quando estamos totalmente sem patrocínio, usamos sacos de estopa. Para exercitar  humildade! Afinal de contas, se o patrocínio fosse equivalente ao nosso ego, produziríamos um musical da Broadway por semana.
Malhação ou remake de novela mexicana no SBT...Eis  questão?

        
            O que mais me surpreende de qualquer forma é o fato do dia do ator cair no mesmo dia do historiador. E eu fico me perguntando quem deve ser a pessoa que atribui os dias às profissões no calendário. E como ela sabia tanto da minha vida que colocou o dia das minhas duas profissões no mesmo 19 de agosto. Se as pessoas distribuíssem presentes para os profissionais conforme seus dias eu com certeza ganharia um só de todo mundo, sob a justificativa de "Comprei um melhorzinho já que é no mesmo dia, né!" . 

Enfim. Acredito que acabarei fazendo mestrado um dia desses. Misturando a parte mais clichê das duas áreas: Brecht na pós modernidade. E serei eternamente blasé.




Ps: queria mandar um beijo pro Marco Antonio Silveira e pra Isis de Castro em cujas aulas nunca escrevi nada. Prestava atenção em tudinho!!!E pro Zé Arnaldo Coelho, que me deu a honra de ir assistir uma peça minha e não obstante contar pra galera do Iphan que eu era "surpreendentemente boa atriz com uma voz absurda!" Seus lindos!

sábado, 11 de agosto de 2012

Entre Tapas e Beijos ( Reflexões Sobre Meu Mal Gosto pra Rapazes)

         Ah, a engenharia! Como sabemos, coube aos homens a missão de pensar exatamente. Meninos montam e desmontam seus carrinhos, todos acham bonitinho, e se você resolve destruir sua boneca, você é uma futura maniaca destruidora de lares. Enfim, assim sendo, aos homens o departamento de engenharia da Unitau! Ou de qualquer outra universidade também, que se pense, são todas iguais. 
       Eu e minha inocência nada pueril, caminhei livremente pelo campus, sem dar bola pras gracinhas, estava a trabalho (acreditem, entregar panfletos também é profissão quando se quer estudar teatro e seu pai não é o Wolf Maya) e, como era de se esperar, observei discretamente, pelas lentes do meu óculos, que roubei do Pelanza, os rapazes que iam e vinham: Altos, baixos, gordos, magros, fortes, fracos, solteiros, casados, loiros, morenos, carecas, cabeludos ( rei, ladrão, policia, capitão,como diria a bela canção da infância...), enfim, uma infinidade. Parecia uma 25 de Março só de homem, tinha pra todo gosto. Uma amiga da época da faculdade me diria "me joga lá e me deixa definhar!!!". Mas claro, nada é perfeito! 
       É que homens de exatas enfim, são homens de exatas. E lá vou eu destilar meu preconceito, já que ao meu ver, eles se limitam a pensar dentro de um quadrante só e blá blá blá não expandem pensamento e blá blá blá não questionam seu meio e blá blá blá usam sempre a mesma gola polo na balada, bebem sempre a mesmo uísque e energético (derrubam no cabelo da gente enquanto dançam inclusive, e fica cheirando gato molhado no outro dia) e pior de tudo, votam no psdb "Não por que acreditam na direita, mas por que sindicalista é tudo vagabundo!" (sic). Enfim esse tipo de pensamento classe média que me deprime o coração.
(antes que me atirem pedras eu sei que nem todos são assim, que estou julgando o todo pela parte, mas todo mundo tem seu preconceito, esse é o meu, tenho direito a minhas idiossincrasias, o Brasil é um pais livre, obrigada) 
           Mas o que mais me perturba é  a falta de assunto. Passado o deslumbramento inicial que eu tenho com aquelas caras lindas que Deus deu pra eles (oh céus, vou definhando..) a falta de assunto é geral. E eu tento fazer piada. No começo elas funcionam. Depois não. Mas vou tentando preencher o vazio da conversa de qualquer forma, e as piadas vão perdendo a graça, e eles vão tentando me fazer entender como funciona uma linha de produção, como se monta um para-choque num carro, a medida das porcas e parafusos sem fim da indústria automobilisitica vale paraibana, e eu não vou entendendo, por que também pouco se me dá esse tipo de coisa, e vou perdendo da paciência até cansar e não atender mais o telefone!           
       Em contrapartida não posso ver um cara fazendo cálculo que já acho uma coisa de louco, os hormônios pululam nas veias. Freud deve explicar. Aquelas réguas e esquadros devem ter algo de representação do falo ao qual supostamente invejo. Ou Freud poderia dizer ainda que, ao ver um cara tirando resultado daquela quantidade de numero com letra junto, eu vejo um afrodisíaco salvífico: Fácil como ele encontra o x da equação, encontrará o ponto g. E o sentido da vida. E saberá o final da novela. E resolverá todos os problemas do mundo. Num cavalo branco. Com a espada numa mão e a calculadora científica na outra! Por que ele achou sentido prático na formula de báskara. 
      E no final das contas vou achando que o problema é a cidade, o planeta ou eu mesma sei lá, vai saber, não bato bem da cabeça mesmo. A verdade é que minha relação com os praticantes do oficio da engenharia  costuma ser tão profunda quanto uma música do Leandro e Leonardo. Daquelas dos anos noventa. Que a gente adora, canta, mas tem vergonha de assumir.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

O Sexto Mandamento - Final

       Ele ressonava, cansado. Deitado de bruços, a cabeça sobre os braços, os olhos semicerrados. A selva de cílios negros mal deixando entrever as pupilas azuladas. Não as escondia nem durante o sono, como se soubesse que assim poderia hipnotizar quem quer que fosse, como cobras fazem com ratinhos em supostos  momentos de sadismo, quando não têm fome, mas apenas prazer em matar. Ela havia sido preza fácil, pensava consigo mesma, e ele, agora confiante, já se deixava adormecer por alguns instantes depois do gozo, antes de levantar-se sem sobressaltos, vestir-se e sumir na calada da noite.

      Catarina não dormia. Fitava as tabuas do teto, entediada, no canto da cama que lhe cabia quando ele estava lá. Constatou, não sem algum pesar, que não havia mais nada de extraordinário naquilo. O homem em seus sonhos tornara-se real, com atitudes reais, cheiros reais e toda aura de mistério evanescera como neblina sob sol mais forte.
          E tudo tornou-se vazio. Vozes, passos, corriqueiros e palpáveis, de uma concretude pouco pesada e desprovida de conteúdo. Só não se repousava em maior calmaria por que a iminente mudança para Santa Barbara se fazia presente. Mudança essa que já julgava  desnecessária. O borrão azul no fundo da sala tornara-se apenas mais um aluno em meio a massa de pensamento aerado que os alunos daquele colégio formavam pelos corredores.

     Ele ainda pulou sua janela aquela noite, e ela entregou-se  sem palavras. Procurou desesperadamente o sentido daquilo, e a força que a fizera cometer tamanho desparate. Não encontrou. Ao abrir os olhos via a sua frente apenas um homem primitivo, iletrado, de poucas maneiras, cuja objetivo vital parecia ser sair jorrando sua semente preciosa em fêmeas no cio pelo mundo, preservando assim sua espécie pouco racional. E entendeu todas as esposas do mundo, que acabavam se entregando a seus maridos, sem saber o sabor de ter vontade. Com paciência simulou o mesmo interesse dos dias anteriores e odiou-se por estar tão apática.
       Pensou muito sobre aquilo posteriormente e concluiu que viciara-se na emoção da coisa. Todavia, já não haviam mais tantos empecilhos. A discrição com que tudo se dava fazia com que não houvessem desconfianças sobre eles e na escola mal se falavam. A adrenalina embalava o caso, que sem  certa aventura ganhava inevitáveis tons de cinza.
     Mas, para sentir-se viva, teria sempre que arriscar o bom nome, a reputação? Será que o faria numa cidade ainda menor? Os dilemas de Catarina estavam longe de acabar e na verdade talvez nunca tenham de fato se resolvido. Mas ali, só uma certeza. Aquele homem novamente ressonando ao seu lado era apenas mais um homem. E o mundo estava repleto deles, não?
       Ele despediu-se também com certa frieza, sem beijo de adeus ou pieguice do tipo. "Boa sorte lá na nova cidade, professora!" acenou. Catarina respondeu o aceno e deitou-se novamente. Seu trem partiria as nove da manhã. Sem sono ela ainda tentou ler um pouco, mas desistiu. Guardou o livro no criado mudo e ainda riu da coincidência: " Au revoir, Érico Verísimo, au revoir!"






sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Meu clichê de fim de tarde...

      Eu vou vivendo a vida e passando pelos lugares, reparando por onde passo, no tamanho que tem o sol.
     Eu passei a vida na janela esperando o sol se pôr. Eu andei pelas ruas, eu terei mais de mil anos e ainda vou lembrar, por que sempre por onde eu passo tenho essa mania com o olhar. É o fim de tarde, o sol caindo. 
     Vou viver mais de mil anos e terei comigo os fins de tarde, eu sentei-me na mureta e vi o sol ir embora. Meu pai me ensinou, eu vi o pôr do sol com ele primeiro. Depois sozinha, depois com todos, eles vieram e se foram, o sol foi o único que permaneceu.
      Com aquela cor nas casas, com aquele vento úmido, a tarde caia em Taubaté, a tarde caia atrás da serra, a tarde caia sobre as árvores da escola nas tardes de sexta.
    A tarde caia enquanto sentávamos na Avenida do Povo, enquanto ele me beijava (o mundo parava, mas a tarde caia), a tarde caia na cidade tão distante, a tarde caia da janela do meu quarto em formato de docinho, a tarde caia quando lia um livro no atrio da igreja, a tarde caia pelos morros e igrejas, a tarde caia quando me vi mulher afinal.
    A tarde caia enquanto a vida me iludia, a tarde caia quando eu me vi sozinha. A tarde caia quando eu levantei, a tarde caia quando tomei rédea de mim, a tarde caia todos os dias, linda lá na memória, a tarde cairá pra sempre nos poros de minha pele, na canção imortalizada.
   A tarde cai, cairia  e cairá, embora os sonhos mudem, as pessoas passem e a vida caminhe. Eu passarei e ela continuará caindo. Estranha, pesada, plácida e infinita. Pelas cruzes tão vazias da morada no alto do morro.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

FATIMA ANDRADE 43444


Eu não podia deixar de falar sobre politica, num momento onde Taubaté passa por uma crise nunca antes vista!É preciso mudança minha gente! Mas mudança com responsabilidade e compromisso! Essa é a minha candidata , em quem eu acredito e tenho certeza do compromisso com a população!





quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Tom e Jerry


            Era uma vida ingrata aquela de pedestre, um sol árido, o óculos na cara, os fones berrando nos ouvidos. Todos os caminhos daquela maldita cidade levavam pro mesmo bairro de nome esquisito que não era o dela. E como a velha ao seu lado queria conversar sobre o neto inteligentíssimo que sempre tirava dez em tudo,e ela achou melhor sair dali e ir caminhando mesmo.     
      Enquanto o sol queimava os cabelos que custavam fortunas para manter liso mesmo com aquele calor todo, ela começou a fazer listinhas, por que haviam sempre as listinhas. Do que faria durante a semana, do que era bom fazer daqui pra frente, como se vestiria na parte da tarde enfim, essas coisas meio bestas, nada demais.
           Quando enjoou das listinhas e viu que ainda faltava caminho, parou novamente num ponto de ônibus  qualquer, livre de velhas que querem promover os avanços cognitivos dos netos para estranhos aleatórios, e riu  lembrando-se da ultima conversa que tivera com o mais novo amigo de infância, e pensou muito em gatos e ratos!
        Todos os homens concordam sempre comigo, pois estou esperando aqui aquele que não concordará. E riu, por que era bem isso.Cruzou os braços como se esperasse que ele ( e por ele entende-se o sujeito discordante) descesse do próximo onibus.
Para que ele chegasse e finalmente descesse do ônibus do destino ( onibus do destino talvez fosse piegas demais, pensou no Tenesse Williams e seu Bonde Chamado Desejo, chamaria seu próprio bonde de desejo se não fosse plágio)  ela teria de aprender a se calar também por que ninguém discorda de quem tem sempre razão, e ela tinha sempre razão. Então ele discordaria dela e lhe diria "agora quero beija-la" e ela concordaria. Mas não, ainda assim não fora boa a ideia, que ele descesse do ônibus e lhe beijasse de uma vez, sem essa historia de pedir, quem pede se subjuga e ela estava cansada disso. Riu, por que naquela metáfora não passava do gato.
        E era um gato daqueles bem grandes e ruidosos, que incomodam a gente no telhado quando faz calor de madrugada. Teve tanta inveja do ratinho, o quieto ratinho da metáfora, por que se esconde pelos buracos da parede, ali dentro expõe o quanto quer. As vezes só rabinho fino para fora, só para mostrar que está presente, mesmo quando esta ausente, deixando o gato enlouquecido tentando enfiar as patas e alcança-lo de qualquer jeito por que não se cansa facil desse tipo de joguinho.Mas já iam-se muitos anos de gataria nessa vida, tanto que ela, cansada, deixou o ratinho brincar de mistério sozinho entre as cavidades da parede e foi tratar de beber seu leite. E ganhou muito com isso.
E então agora queria muito, mas muito mesmo virar ratinho e ficar bem escondida nas cavidades da parede, esperando, esperando... Mas isso lhe dava tédio em contrapartida e como não concluiu nada muito preciso, deu graças a Deus quando o ônibus (o literal) passou pelo ponto e deixou-a em casa minutos depois, quando já pensava em outra coisa.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

O Sexto Mandamento VI



" O problema é a saudade do pecado. É a memória dos sentidos. Essa sim é perigosa e nos faz sentir falta daquilo que não deveríamos sequer ter feito a primeira vez. Ela nos faz persistir  em certos delírios incertos e nos faz mergulhar em tragédias que são por vezes mil vezes anunciadas, mas que nosso ouvidos insistem em ignorar..." (baseado no que Padre Nelson disse a Frei Malthus em "Hilda Furacão". Mas ele poderia tê-lo dito também a Catarina...) 





      "Vou embora agora... A noite já vai avançada..." ele disse. Catarina, por sua vez, revirou-se na cama. Sentia-se uma estranha de si mesma, como se visse o própio corpo de fora, e mesmo dentro de todos os sentimentos que corriam dentro de si como fluidos, ela questionou. A voz baixa, quase um murmúrio "Que dirá você à pobre coitada, a hora que finalmente chegar em casa, com cheiros outros que não são os dela?" ele riu de lado, abotoava a camisa "Não sinta remorsos, professora, voltarei todo todo pra ela, que é capaz de nem perceber que estive fora..." e ela, num estalo lúcido "Você jamais se casaria com uma mulher minimamente esperta, não é?" e ele continuava sorrindo, terminando de vestir-se " Ô professora, vê se entende de uma vez por todas, não fosse a senhorita, seria outra. A gente que é homem é criado pra isso mesmo, não foi a primeira nem a última vez. No mais, a senhorita divertiu-se deveras. Pensa que não vi?"  E ela odiou-o por estar tão correto "Você deve ser um ótimo ator dentro de casa, ela não deve desconfiar de nada. Na verdade, eu também não desconfiaria, somos todas umas otárias.." e ele riu " As coisas são como são e não como deveriam ser."
            Aquela noite ressoou na cabeça de Catarina muito mais do que ela poderia supor. Já não tinha mais foco, andava mole, difícil levantar-se as cinco e quarenta e cinco da manhã naquele frio, ela que nunca tivera problemas com nada. Dar aulas tornara-se um grande martírio, a sala de aula lhe perturbava, o zumbido das crianças cochichando, o barulho do lápis cortando o papel, o sinal estridente marcando as horas, tudo era motivo de irritação. Antes era até boa com os pequenos. Agora a repreensão. 
      Quanto ao pequeno aluno, filho daquele que a atormentava, a criança lá na ultima carteira, fazia esforço sobre humano para enxergar. Por que a despeito dos belos olhos, ostentava também bela miopia. O pobre do menino, alheio a tudo que passava, levava nos ombros sozinho todo ônus daquilo que seu pai causava e sua professora dissimulava.
        Às onze em ponto novamente ela apagou  luz do quarto e abriu a janela do quintal. O vulto pulou para dentro. O quarto em penumbra estava convidativo para a ocasião "Oh céus, eu não deveria fazer isso novamente..." ela suspirou enquanto fechava a janela " Se contar a alguém, digo que invadiu o quarto e me forçou a  tal coisa. E que o fiz para proteger minha madrinha..." e ele, como quem bate continência a um superior, respondeu-lhe "Sim, senhorita!". As mulheres passam a vida se justificando a cada ínfima vontade que têm de fazer aquilo que os homens sempre fizeram sem maiores problemas, ela pode constatar bem.
        E assim foi, durante todas as noites. Uma semana inteira. Por que o dia chegava, mas quando a noite caia, sua cabeça em outra coisa não se fixava. Ansiava. E perguntava-se se aquilo cessaria com sua partida. Por que não poderia continuar assim.
       Era sexta feira, e ela já ia exaurida pelos cantos "Estás doente, Catarina?" perguntou-lhe Elena "Talvez..." respondeu-lhe com certo sorriso nos lábios, a cabeça envolta em delícias ."Tem uma mãe de aluno querendo falar com você..." A Elena ainda disse e Catarina logo viu, a mãe do menino, a esposa infeliz: "Meu pequeno tem ido tão mal nos testes..."ela pode reparar melhor nas mãos tão brancas da pobre mulher, tinham então a mesma idade e sinas tão parecidas, mas distante como elas eram, queria abraçar-lhe e dizer  "Não és a única vítima..." mas talvez  aquela pudesse ser a mais feliz das mulheres do mundo, como julgá-la? Ela que mal tinha voz, Catarina fazia um esforço sobre humano para ouvi-la "Tenho pena de meu filhinho..." e também ela, Catarina, o teve. Do menino e de si mesma que não tinha mais forças pra fugir e só se deixava levar. Mas algo em si já ia esvaziando-se de sentido. Tinha ainda uma semana em Mariana. 

Chique, benhê!

O jornalista Fabio Seletti fez uma matéria super fofa sobre o blog pro jornal  "O Liberal" da Região dos Inconfidentes !! Estamos chique, heim benhê????

quarta-feira, 25 de julho de 2012

A Divina Comédia da Vida ( desabafo sobre meus dias em Mariana)

        Sentada na varanda da minha antiga República. Eu obviamente passei os últimos dias repensando em minha vida e em quanta coisa já aconteceu. E, meu Deus, quanta coisa já aconteceu! A cidade mudou muito pouco, mas as pessoas vieram e se foram, e há algo em mim que morreu. E isso me pareceu tão grande....
           Há  também a saudade daqueles dias, na qual vejo que muitos de meus ex-companheiros ainda estão imersos. Há, ás vezes, a sensação de jamais ter saído daqui, dada a igualdade de certas situações, como se o último ano e meio não tivesse acontecido ( e na verdade foi um ano de visceral dor e luto, difíceis mas necessários, a metáfora da fênix se enquadra aqui, mas prefiro deixar pra lá. Esse texto já está cheio de clichês), mas antes de tudo teve o confronto comigo mesma
           Houve uma Dani que morou aqui uma vez que era muito mais jovem e tinha dentro do coração mil e um sonhos e nenhuma ideia de como realizá-los. Houve uma Dani que morou aqui e era de uma inocência atroz. Houve uma Dani que morou aqui que se afundava em tédio, depois em preguiça. Houve uma Dani que  morou aqui e que tinha acessos de raiva ao sentir morrer seu potencial criativo, ruminando uma faculdade que não gostava e um relacionamento doentio. Houve uma Dani que morou aqui que rezava para ir embora de uma vez e que isso doesse o menos possível. Nenhuma das duas preces foram atendidas. Deus jamais deixa de nos dar o que é necessário ao espirito. Nem que seja a dor.
        O confronto foi forte, como se nos tivéssemos trombado na rua, como se dois carros em alta velocidade se chocassem. Com o impacto caímos as duas por instantes, presente e passado, mas o presente falou mais alto, levantei-me, me vi de frente, finalmente mulher. Finalmente me encaro, aos 24 anos, com um pezinho no abismo misterioso do destino, pronta pra fazer malas de novo e ir em busca do próprio sonho.  
        Foi de fato uma surpresa. Eu tinha tabus e tinha meus medos. Me julgava relegada ao esquecimento, ora essa, a vida me mostrou como meu próprio vilão mora dentro da minha própria cabeça, eu que sempre me dediquei tanto... Não fui esquecida como pude constatar, neurose minha, mas fui deveras esperada, pelos bons amigos que Deus me deu.
        Passamos todos por um processo duro de amadurecimento no ultimo ano, que destroçou sem nenhuma pena tudo aquilo que restava de inocência na nossa existência. E durante muito tempo de trevas, eu não tive a minima esperança de que aquilo pudesse de fato passar. Mas passou, minha gente, passou. E a Dani que caminha por essas ruas, que visita essas ladeiras e abraça essas pessoas é deveras leve e bem amada . (amém)  
       A vida caminha para frente como um trator, por mais que se queria parar no tempo, ele te empurra. Isso eu tenho dito muitas vezes por esses dias por que nunca essa constatação me pareceu tão certa. Aqueles que aqui ainda moram, remanescentes daquela época me parecem meio perdidos no limbo das novidades, loucos para também fugirem daqui. A vida há de nos separar a todos se tivermos sorte. Por que é isso que sempre quisemos.
         E são duas igrejas na mesma praça, e são colinas de um verde de fazer doer os olhos, é a torre do colégio onde trabalhei, é o cheiro da casa onde morei, é o jeito manso de falar, são os sinos que não param de tocar, tudo isso me fez ver que a minha vida assim mesmo seguiu, como o trator do tempo tratou de esmagar alguns antigos sonhos cheirando a mofo, tratou de me trazer os novos para ocupar-lhes os espaços. Já era hora. 
         Não sei quando se deu isso, mas não me refiro mais a mim mesma como garota. Por que não cabe mais. Sou mulher não por escolha, mas por que o tempo quis assim. Parece bobagem, mas é o espelho embutido no espirito que dá toada daquilo que vemos refletido do lado de fora.
Finalizando, tem sido libertador. Essa é a palavra... Ainda tenho mais uns dias por aqui , e amanhã talvez caia o último dos tabus que ainda não enfrentei. Como nos filmes de ação, o embate mais difícil é sempre o ultimo. Pois que venha  e se vá. Já é hora de sorrir e seguir em paz. Já foram lágrimas demais....




ps: o ultimo dos tabus caiu, leve como uma folha seca de uma arvore, sem nenhuma dor, sem nenhuma vontade. Simplesmente caiu por terra , deixando nenhum rastro. A vida vai se encarregar de  fazer justiça as magoas que deixei pra traz. Mas como repeti ontem a exaustão, não estarei aqui pra ver a derrocada. Icebergs degelam por dentro em silencio e quando menos se espera paredes de gelo milhares de anos conservadas vão abaixo, como o castelo de cartas  fragil que sempre foi. Mas até ai estarei longe demais pra me lembrar.....