quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Desastres

       No mundo restaram poucos fumantes, por que o fascismo é mesmo uma coisa delicada e sutil. Acabar com o pulmão nunca foi nada perto de muita barbaridade que se vê por ai, mas esse não era mesmo o ponto, ela saiu na varanda, deixando a festa lá dentro, por que precisava de tabaco nas veias. E de lá contou quantos fios rodeavam o poste, era uma casa no centro, e o centro era grande, não havia muito horizonte, contou os fios do poste, depois os carros na rua, e emprestou a ele um cigarro, por que ele não trazia consigo os seus, vai saber, às vezes os lugares fecham, e tudo acaba tão cedo, mas a noite ainda ia adentro, complicada, emprestou cigarro e isqueiro, depois olhou de novo os fios no poste, não se atinha a maiores detalhes a principio, por isso não deu grande importância. Tudo vinha sempre depois, muito depois.
       O mundo era culpa dos cálculos, quanto preconceito naquela cabeça, ele só escutava "Não creio que seja isso.." murmurou, mas ela não sabia, colocou a culpa dos males naqueles que calculavam, no concreto armado dos viadutos, na falta de poesia do cimento, na ausência de alegria do cinza. Seria tudo tão mais claro se fossem as coisas menos contabilizadas e mais declamadas, a plenos pulmões, pelas bocas irriquietas que perambulavam pelas ruas, enchendo de som liberto tão grandiosa cidade.
       Ele andava muito magro por aqueles idos e fumava muito. Não entendia muita coisa nessa vida, se sempre pudera de tudo, era uma criança ainda quando a mãe lhe disse "Podes tudo, meu filho!" e ele acreditara e desde então sempre pudera, mas quando perdera a amada moça, viu que talvez não pudesse "Eu tinha que parar de fazer tudo que me vem a cabeça" andava bebendo também, há pouco tempo capotara o carro. " Qual o problema nos cálculos, são apenas números, eles vem e vão como qualquer coisa da vida, não há nada que se possa fazer, senão deixa-las passar, e mesmo que no lugar de números  fizéssemos nosso prédios apoiados em poesia, um dia, mesmo assim, todos acabariam caindo, desmoronando, as palavras são tão inúteis quantos os números, quanto os fios que seguram esse poste. Inúteis." e ela engoliu preconceitos , deu uma ultima tragada e depois não soube mais.
      Chamaram-na na sala, ou outro cômodo, era uma festa afinal, mas como cantar depois daquilo, o mundo, poesia ou número, dia ou outro acaba desmoronando, oh céus, quanta coisa. 
      "Anda bebendo demais esse nosso amigo!" ainda disse o anfitrião. E todos concordavam, enchendo-lhe o copo com cerveja, beber demais nunca foi privilegio de uma pessoa só, todos sabiam, bebia-se a revelia de qualquer pequena dor, quando advinham as maiores, ninguém nem percebia, comentava-se para não perder o habito.
      Já havia muito tempo desde a ultima vez que fora até aquela casa, cantavam como sempre, anos passam e hábitos não mudam, e ela resolveu sair novamente , mas cansou-se de contar os fios do poste, era tudo muito natural. "Você me parece meio perdido..." e ele apenas sorriu "Quem não está?" e depois de longa pausa  "Capotei meu carro dia desses." E quem não sabia? Capotou o carro e todas as outras coisas, foram tantos dias perdidos, mas ela vira tudo de longe, imersa que estava no próprio desastre "Capotei meu carro e não senti nada.". E ela acendeu outro cigarro "Eles vem assim mesmo, acidentes de carro ou despedidas, às vezes tem o mesmo efeito, não? A Frida Kahlo disse isso uma vez ou algo parecido." Ele olhou o poste, por que eles não se olhavam nunca. "Deve ter dito, todo mundo diz tanta coisa. Não sei, não lembro. É a aquela com as grandes sobrancelhas, não?" e ela confirmou.
      E a noite acabou, a festa acabou antes, todos foram dormir e os sonhos todos turvos, por que ela finalmente conseguia repousar, mas não pode deixar de lembrar, logo pela manhã, das cicatrizes cujos caminhos foram mapas daquele corpo que lhe pertencera a noite toda.  Marcas do desastre. As cicatrizes dela, tão profundas quanto aquelas, menos palpaveis porém, bem disfarçáveis, ele as tinha em todo corpo, toda a pele "Sou prova viva do que me ocorreu, apesar de já não senti-lo" bebera, fumara, perdera peso, estava longe da bela amada, e ela entendeu tudo, mas não dissera nada. Somente as tocara, aquelas cicatrizes tão bem marcadas, tantos médicos intervindo naquele corpo, para faze-lo voltar a vida, e ele voltara, mas  corpo tão vivo abrigava  a alma vazia.
        Sonhava, e repousou naquele peito durante longas horas (como se sonhar que está dormindo fizesse algum sentido) e acordou consolada. Fossem poesias ou números, no final tudo afundava. O sol entrava pela janela e ela tinha sede. Como há muito tempo ela quisera finalmente voltar a querer machucar-se, voltar a querer arriscar-se, sem escudos, frente a tão perigoso campo de batalha. Mas era tarde demais ali. A amada voltara (desastre ou não) e ocupara o lugar que deixara vazio. Mas isso também já não importava.
       Sentou-se no sofá e esperou. Aquela porra toda compensava. Finalmente compensava. Deixara de fazer sentido há muito tempo, mas parecia de qualquer forma encaixar-se na vida como se nunca houvesse saído dali Acendeu o ultimo cigarro da cartela que quase toda ele fumara com ela. E viu aquela noite sumir de vez na fumaça.


quinta-feira, 23 de agosto de 2012

PARTIDO DA SINCERIDADE

É fato, todo mundo sabe da minha paixão platônica pelo Marcelo Adnet, por que ele é incrivelmente talentoso, inteligente, engraçado e casado com a Dani Calabresa que é a melhor do universo. E nessa época de eleições não poderia deixar de postar essa perola do humor cretino que ele tem. Adoro!Partido da Sinceridade....pelo menos com esse não tem surpresa!


segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Feliz dia 19 de Agosto!

           Ah o bom e velho 19 de agosto! É o dia que fico pensando que a vida é uma sequência de coincidencias imbecis. Eu, assim como o marido da Rochelle, poderia ter dois empregos. Vamos aos fatos.
     Sou formada em História naquela nave louca que é a Universidade Federal de Ouro Preto. Um curso muito bacana onde pude aprender a beber e jogar truco, e onde ouvi falar pela primeira vez de um tal de Marc Bloch , que a gente ama mais que feijão com arroz. O cara era bom mesmo. Diz a lenda que conseguiu escrever quase um livro inteiro dentro da prisão nazista, sem acesso a referências bibliográficas quaisquer e acertou todas, só de memória! Acredito que esse fato afetou tanto o orgulho de classe dos historiadores que vários professores ao dar aula ficavam fazendo citações em cima de citações e não explicavam porra nenhuma. E eu ficava lá na ultima carteira, escrevendo alguns dos contos que você lê neste blog, por que, afinal de contas, eu sempre tive as minhas prioridades.
(Marc Bloch de ladinho. Tão amado que até o John  Lennon  copiaria  seu óculos style anos mais tarde)
        Bloch não terminou o livro. O exercito nazista o matou antes do fim. Mas, deixou boa parte já pronta, o que nos fazia pensar, em época de provas, na ineficiência dos serviços públicos quando se precisa deles, mesmo no primeiro mundo. Se o exercito alemão fosse de fato eficiente  teria matado o Bloch antes de ele ter escrito tudo aquilo! (essa piada é clichê de nove entre dez alunos do primeiro periodo.)
        A maior diversão de um historiador é destruir as teses de seus colegas.  O pau quebrava em alguns seminários. Mas tudo na base do "Caro colega está equivocado nesta sua colocação...". Aliás, desacreditar tese do coleguinha é coisa que aprendemos  desde o principio, então já no primeiro ano víamos alguns alunos ávidos em desbancar os professores, o que as vezes tornava as aulas parecidas com um torneio de repentistas nordestinos da praça da Sé.        





           ( No primeiro período me disseram que os historiadores davam voz aos mortos. Achei forte!)



         De qualquer forma sempre achei fantástico  o que o Bloch dizia sobre como a História deveria ser feita numa linguagem que alcançasse a todos. Não há sentido nenhum em tanto estudo se não for acessível. Mas, obviamente não é bem assim que acotece.
         Dói no coração do historiador ver o 1822 virar best seller. V um ex colega espumar de odio quando eu disse que era válido o esforço do Eduardo Bueno em disseminar o interesse histórico. E ele mal tinha começado o curso! "Eduardo Bueno é jornalista!Não estudou o bastante!". E no final das contas muita coisa realmente não tem muito sentido, mas se os historiadores (que estudam bastante) pensassem mais vezes fora da caixinha talvez existissem mais obras melhor embasadas e com um linguagem mais acessível a maioria da população, gerando mais interesse! Mas a maioria dos acadêmicos passa seus dias procurando palavras difíceis nos dicionários, que possam dificultar a leitura de suas teorias, para que ao seu redor digam que sua escrita é complexa (um puta elogio!!).
Mary del Priore: Inteligencia e Loosho.  É a Glória Calil  da historiografia!











    Assim como a roupa do rei, só os inteligentes conseguem ver esse tipo de coisa, como a Mary del Priore, que é puro loosho, glamour e competência, escreve com a maestria de um romancista e  embasamento teórico  para nenhum primeiro anista empolado botar defeito!
       Enfim, uma vez formada, diplominha de federal na mão, (orgulho da mamãe que fala isso pra todo mundo) olhei pra vida e fui finalmente fazer teatro. E no teatro fiz uma descoberta encantadora! Meu curso de história me servia finalmente pra alguma coisa. Construir um personagem é muito melhor quando se entende contextos, a arte é toda contexto e toda pensamento humano, beijo Zé Arnaldo!
       Gosto das artes cênicas, do teatro mesmo. Aquela coisa sofrida de se fazer, mas linda de se ver. E toda vez que falo pra alguém que estudo teatro elas me pedem pra lembrar delas no arquivo confidencial do Faustão, como se o destino de todos os atores fosse a Globo. 



Fui no arquivo confidencial e me lembrei de você.
    Mas sempre que digo que acho TV um porre as pessoas me olham como se eu fosse de outro planeta (afinal de contas, de que serve ser atriz se não for para sair em capa de revista de fofoca com um affair misterioso em algum barzinho badalado do Rio de Janeiro?) 
    Há  também o clube daqueles que acham uma judiação uma moça que estudou tanto jogar tudo pro alto pra fazer teatro. E há também a galera que pergunta se eu pretendo continuar estudando e quando falo que já estudo,  reiteram "Mas estudar que eu digo é estudar, mesmo!" e eu fico pensando o que  podem vir a ser  as horas que passo debruçada no Stanislaviski ...
        Atores não usam boina e cachecol. Por que somos pobres, muito pobres. Às vezes, quando estamos totalmente sem patrocínio, usamos sacos de estopa. Para exercitar  humildade! Afinal de contas, se o patrocínio fosse equivalente ao nosso ego, produziríamos um musical da Broadway por semana.
Malhação ou remake de novela mexicana no SBT...Eis  questão?

        
            O que mais me surpreende de qualquer forma é o fato do dia do ator cair no mesmo dia do historiador. E eu fico me perguntando quem deve ser a pessoa que atribui os dias às profissões no calendário. E como ela sabia tanto da minha vida que colocou o dia das minhas duas profissões no mesmo 19 de agosto. Se as pessoas distribuíssem presentes para os profissionais conforme seus dias eu com certeza ganharia um só de todo mundo, sob a justificativa de "Comprei um melhorzinho já que é no mesmo dia, né!" . 

Enfim. Acredito que acabarei fazendo mestrado um dia desses. Misturando a parte mais clichê das duas áreas: Brecht na pós modernidade. E serei eternamente blasé.




Ps: queria mandar um beijo pro Marco Antonio Silveira e pra Isis de Castro em cujas aulas nunca escrevi nada. Prestava atenção em tudinho!!!E pro Zé Arnaldo Coelho, que me deu a honra de ir assistir uma peça minha e não obstante contar pra galera do Iphan que eu era "surpreendentemente boa atriz com uma voz absurda!" Seus lindos!

sábado, 11 de agosto de 2012

Entre Tapas e Beijos ( Reflexões Sobre Meu Mal Gosto pra Rapazes)

         Ah, a engenharia! Como sabemos, coube aos homens a missão de pensar exatamente. Meninos montam e desmontam seus carrinhos, todos acham bonitinho, e se você resolve destruir sua boneca, você é uma futura maniaca destruidora de lares. Enfim, assim sendo, aos homens o departamento de engenharia da Unitau! Ou de qualquer outra universidade também, que se pense, são todas iguais. 
       Eu e minha inocência nada pueril, caminhei livremente pelo campus, sem dar bola pras gracinhas, estava a trabalho (acreditem, entregar panfletos também é profissão quando se quer estudar teatro e seu pai não é o Wolf Maya) e, como era de se esperar, observei discretamente, pelas lentes do meu óculos, que roubei do Pelanza, os rapazes que iam e vinham: Altos, baixos, gordos, magros, fortes, fracos, solteiros, casados, loiros, morenos, carecas, cabeludos ( rei, ladrão, policia, capitão,como diria a bela canção da infância...), enfim, uma infinidade. Parecia uma 25 de Março só de homem, tinha pra todo gosto. Uma amiga da época da faculdade me diria "me joga lá e me deixa definhar!!!". Mas claro, nada é perfeito! 
       É que homens de exatas enfim, são homens de exatas. E lá vou eu destilar meu preconceito, já que ao meu ver, eles se limitam a pensar dentro de um quadrante só e blá blá blá não expandem pensamento e blá blá blá não questionam seu meio e blá blá blá usam sempre a mesma gola polo na balada, bebem sempre a mesmo uísque e energético (derrubam no cabelo da gente enquanto dançam inclusive, e fica cheirando gato molhado no outro dia) e pior de tudo, votam no psdb "Não por que acreditam na direita, mas por que sindicalista é tudo vagabundo!" (sic). Enfim esse tipo de pensamento classe média que me deprime o coração.
(antes que me atirem pedras eu sei que nem todos são assim, que estou julgando o todo pela parte, mas todo mundo tem seu preconceito, esse é o meu, tenho direito a minhas idiossincrasias, o Brasil é um pais livre, obrigada) 
           Mas o que mais me perturba é  a falta de assunto. Passado o deslumbramento inicial que eu tenho com aquelas caras lindas que Deus deu pra eles (oh céus, vou definhando..) a falta de assunto é geral. E eu tento fazer piada. No começo elas funcionam. Depois não. Mas vou tentando preencher o vazio da conversa de qualquer forma, e as piadas vão perdendo a graça, e eles vão tentando me fazer entender como funciona uma linha de produção, como se monta um para-choque num carro, a medida das porcas e parafusos sem fim da indústria automobilisitica vale paraibana, e eu não vou entendendo, por que também pouco se me dá esse tipo de coisa, e vou perdendo da paciência até cansar e não atender mais o telefone!           
       Em contrapartida não posso ver um cara fazendo cálculo que já acho uma coisa de louco, os hormônios pululam nas veias. Freud deve explicar. Aquelas réguas e esquadros devem ter algo de representação do falo ao qual supostamente invejo. Ou Freud poderia dizer ainda que, ao ver um cara tirando resultado daquela quantidade de numero com letra junto, eu vejo um afrodisíaco salvífico: Fácil como ele encontra o x da equação, encontrará o ponto g. E o sentido da vida. E saberá o final da novela. E resolverá todos os problemas do mundo. Num cavalo branco. Com a espada numa mão e a calculadora científica na outra! Por que ele achou sentido prático na formula de báskara. 
      E no final das contas vou achando que o problema é a cidade, o planeta ou eu mesma sei lá, vai saber, não bato bem da cabeça mesmo. A verdade é que minha relação com os praticantes do oficio da engenharia  costuma ser tão profunda quanto uma música do Leandro e Leonardo. Daquelas dos anos noventa. Que a gente adora, canta, mas tem vergonha de assumir.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

O Sexto Mandamento - Final

       Ele ressonava, cansado. Deitado de bruços, a cabeça sobre os braços, os olhos semicerrados. A selva de cílios negros mal deixando entrever as pupilas azuladas. Não as escondia nem durante o sono, como se soubesse que assim poderia hipnotizar quem quer que fosse, como cobras fazem com ratinhos em supostos  momentos de sadismo, quando não têm fome, mas apenas prazer em matar. Ela havia sido preza fácil, pensava consigo mesma, e ele, agora confiante, já se deixava adormecer por alguns instantes depois do gozo, antes de levantar-se sem sobressaltos, vestir-se e sumir na calada da noite.

      Catarina não dormia. Fitava as tabuas do teto, entediada, no canto da cama que lhe cabia quando ele estava lá. Constatou, não sem algum pesar, que não havia mais nada de extraordinário naquilo. O homem em seus sonhos tornara-se real, com atitudes reais, cheiros reais e toda aura de mistério evanescera como neblina sob sol mais forte.
          E tudo tornou-se vazio. Vozes, passos, corriqueiros e palpáveis, de uma concretude pouco pesada e desprovida de conteúdo. Só não se repousava em maior calmaria por que a iminente mudança para Santa Barbara se fazia presente. Mudança essa que já julgava  desnecessária. O borrão azul no fundo da sala tornara-se apenas mais um aluno em meio a massa de pensamento aerado que os alunos daquele colégio formavam pelos corredores.

     Ele ainda pulou sua janela aquela noite, e ela entregou-se  sem palavras. Procurou desesperadamente o sentido daquilo, e a força que a fizera cometer tamanho desparate. Não encontrou. Ao abrir os olhos via a sua frente apenas um homem primitivo, iletrado, de poucas maneiras, cuja objetivo vital parecia ser sair jorrando sua semente preciosa em fêmeas no cio pelo mundo, preservando assim sua espécie pouco racional. E entendeu todas as esposas do mundo, que acabavam se entregando a seus maridos, sem saber o sabor de ter vontade. Com paciência simulou o mesmo interesse dos dias anteriores e odiou-se por estar tão apática.
       Pensou muito sobre aquilo posteriormente e concluiu que viciara-se na emoção da coisa. Todavia, já não haviam mais tantos empecilhos. A discrição com que tudo se dava fazia com que não houvessem desconfianças sobre eles e na escola mal se falavam. A adrenalina embalava o caso, que sem  certa aventura ganhava inevitáveis tons de cinza.
     Mas, para sentir-se viva, teria sempre que arriscar o bom nome, a reputação? Será que o faria numa cidade ainda menor? Os dilemas de Catarina estavam longe de acabar e na verdade talvez nunca tenham de fato se resolvido. Mas ali, só uma certeza. Aquele homem novamente ressonando ao seu lado era apenas mais um homem. E o mundo estava repleto deles, não?
       Ele despediu-se também com certa frieza, sem beijo de adeus ou pieguice do tipo. "Boa sorte lá na nova cidade, professora!" acenou. Catarina respondeu o aceno e deitou-se novamente. Seu trem partiria as nove da manhã. Sem sono ela ainda tentou ler um pouco, mas desistiu. Guardou o livro no criado mudo e ainda riu da coincidência: " Au revoir, Érico Verísimo, au revoir!"






sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Meu clichê de fim de tarde...

      Eu vou vivendo a vida e passando pelos lugares, reparando por onde passo, no tamanho que tem o sol.
     Eu passei a vida na janela esperando o sol se pôr. Eu andei pelas ruas, eu terei mais de mil anos e ainda vou lembrar, por que sempre por onde eu passo tenho essa mania com o olhar. É o fim de tarde, o sol caindo. 
     Vou viver mais de mil anos e terei comigo os fins de tarde, eu sentei-me na mureta e vi o sol ir embora. Meu pai me ensinou, eu vi o pôr do sol com ele primeiro. Depois sozinha, depois com todos, eles vieram e se foram, o sol foi o único que permaneceu.
      Com aquela cor nas casas, com aquele vento úmido, a tarde caia em Taubaté, a tarde caia atrás da serra, a tarde caia sobre as árvores da escola nas tardes de sexta.
    A tarde caia enquanto sentávamos na Avenida do Povo, enquanto ele me beijava (o mundo parava, mas a tarde caia), a tarde caia na cidade tão distante, a tarde caia da janela do meu quarto em formato de docinho, a tarde caia quando lia um livro no atrio da igreja, a tarde caia pelos morros e igrejas, a tarde caia quando me vi mulher afinal.
    A tarde caia enquanto a vida me iludia, a tarde caia quando eu me vi sozinha. A tarde caia quando eu levantei, a tarde caia quando tomei rédea de mim, a tarde caia todos os dias, linda lá na memória, a tarde cairá pra sempre nos poros de minha pele, na canção imortalizada.
   A tarde cai, cairia  e cairá, embora os sonhos mudem, as pessoas passem e a vida caminhe. Eu passarei e ela continuará caindo. Estranha, pesada, plácida e infinita. Pelas cruzes tão vazias da morada no alto do morro.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

FATIMA ANDRADE 43444


Eu não podia deixar de falar sobre politica, num momento onde Taubaté passa por uma crise nunca antes vista!É preciso mudança minha gente! Mas mudança com responsabilidade e compromisso! Essa é a minha candidata , em quem eu acredito e tenho certeza do compromisso com a população!





quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Tom e Jerry


            Era uma vida ingrata aquela de pedestre, um sol árido, o óculos na cara, os fones berrando nos ouvidos. Todos os caminhos daquela maldita cidade levavam pro mesmo bairro de nome esquisito que não era o dela. E como a velha ao seu lado queria conversar sobre o neto inteligentíssimo que sempre tirava dez em tudo,e ela achou melhor sair dali e ir caminhando mesmo.     
      Enquanto o sol queimava os cabelos que custavam fortunas para manter liso mesmo com aquele calor todo, ela começou a fazer listinhas, por que haviam sempre as listinhas. Do que faria durante a semana, do que era bom fazer daqui pra frente, como se vestiria na parte da tarde enfim, essas coisas meio bestas, nada demais.
           Quando enjoou das listinhas e viu que ainda faltava caminho, parou novamente num ponto de ônibus  qualquer, livre de velhas que querem promover os avanços cognitivos dos netos para estranhos aleatórios, e riu  lembrando-se da ultima conversa que tivera com o mais novo amigo de infância, e pensou muito em gatos e ratos!
        Todos os homens concordam sempre comigo, pois estou esperando aqui aquele que não concordará. E riu, por que era bem isso.Cruzou os braços como se esperasse que ele ( e por ele entende-se o sujeito discordante) descesse do próximo onibus.
Para que ele chegasse e finalmente descesse do ônibus do destino ( onibus do destino talvez fosse piegas demais, pensou no Tenesse Williams e seu Bonde Chamado Desejo, chamaria seu próprio bonde de desejo se não fosse plágio)  ela teria de aprender a se calar também por que ninguém discorda de quem tem sempre razão, e ela tinha sempre razão. Então ele discordaria dela e lhe diria "agora quero beija-la" e ela concordaria. Mas não, ainda assim não fora boa a ideia, que ele descesse do ônibus e lhe beijasse de uma vez, sem essa historia de pedir, quem pede se subjuga e ela estava cansada disso. Riu, por que naquela metáfora não passava do gato.
        E era um gato daqueles bem grandes e ruidosos, que incomodam a gente no telhado quando faz calor de madrugada. Teve tanta inveja do ratinho, o quieto ratinho da metáfora, por que se esconde pelos buracos da parede, ali dentro expõe o quanto quer. As vezes só rabinho fino para fora, só para mostrar que está presente, mesmo quando esta ausente, deixando o gato enlouquecido tentando enfiar as patas e alcança-lo de qualquer jeito por que não se cansa facil desse tipo de joguinho.Mas já iam-se muitos anos de gataria nessa vida, tanto que ela, cansada, deixou o ratinho brincar de mistério sozinho entre as cavidades da parede e foi tratar de beber seu leite. E ganhou muito com isso.
E então agora queria muito, mas muito mesmo virar ratinho e ficar bem escondida nas cavidades da parede, esperando, esperando... Mas isso lhe dava tédio em contrapartida e como não concluiu nada muito preciso, deu graças a Deus quando o ônibus (o literal) passou pelo ponto e deixou-a em casa minutos depois, quando já pensava em outra coisa.