quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Tom e Jerry


            Era uma vida ingrata aquela de pedestre, um sol árido, o óculos na cara, os fones berrando nos ouvidos. Todos os caminhos daquela maldita cidade levavam pro mesmo bairro de nome esquisito que não era o dela. E como a velha ao seu lado queria conversar sobre o neto inteligentíssimo que sempre tirava dez em tudo,e ela achou melhor sair dali e ir caminhando mesmo.     
      Enquanto o sol queimava os cabelos que custavam fortunas para manter liso mesmo com aquele calor todo, ela começou a fazer listinhas, por que haviam sempre as listinhas. Do que faria durante a semana, do que era bom fazer daqui pra frente, como se vestiria na parte da tarde enfim, essas coisas meio bestas, nada demais.
           Quando enjoou das listinhas e viu que ainda faltava caminho, parou novamente num ponto de ônibus  qualquer, livre de velhas que querem promover os avanços cognitivos dos netos para estranhos aleatórios, e riu  lembrando-se da ultima conversa que tivera com o mais novo amigo de infância, e pensou muito em gatos e ratos!
        Todos os homens concordam sempre comigo, pois estou esperando aqui aquele que não concordará. E riu, por que era bem isso.Cruzou os braços como se esperasse que ele ( e por ele entende-se o sujeito discordante) descesse do próximo onibus.
Para que ele chegasse e finalmente descesse do ônibus do destino ( onibus do destino talvez fosse piegas demais, pensou no Tenesse Williams e seu Bonde Chamado Desejo, chamaria seu próprio bonde de desejo se não fosse plágio)  ela teria de aprender a se calar também por que ninguém discorda de quem tem sempre razão, e ela tinha sempre razão. Então ele discordaria dela e lhe diria "agora quero beija-la" e ela concordaria. Mas não, ainda assim não fora boa a ideia, que ele descesse do ônibus e lhe beijasse de uma vez, sem essa historia de pedir, quem pede se subjuga e ela estava cansada disso. Riu, por que naquela metáfora não passava do gato.
        E era um gato daqueles bem grandes e ruidosos, que incomodam a gente no telhado quando faz calor de madrugada. Teve tanta inveja do ratinho, o quieto ratinho da metáfora, por que se esconde pelos buracos da parede, ali dentro expõe o quanto quer. As vezes só rabinho fino para fora, só para mostrar que está presente, mesmo quando esta ausente, deixando o gato enlouquecido tentando enfiar as patas e alcança-lo de qualquer jeito por que não se cansa facil desse tipo de joguinho.Mas já iam-se muitos anos de gataria nessa vida, tanto que ela, cansada, deixou o ratinho brincar de mistério sozinho entre as cavidades da parede e foi tratar de beber seu leite. E ganhou muito com isso.
E então agora queria muito, mas muito mesmo virar ratinho e ficar bem escondida nas cavidades da parede, esperando, esperando... Mas isso lhe dava tédio em contrapartida e como não concluiu nada muito preciso, deu graças a Deus quando o ônibus (o literal) passou pelo ponto e deixou-a em casa minutos depois, quando já pensava em outra coisa.

Nenhum comentário: